Eles
também são aliens, aparecendo em formas bizarras e intrigando os
cientistas. Mas, ao invés de residirem no espaço, esses alienígenas
habitam um reino subterrâneo escuro, circulando a energia do interior da
Terra.
A maioria dos
intraterrestres vive embaixo do fundo oceânico, em uma biosfera
invisível que é um amontoado de estranhos organismos.
Muitos
fazem suas casas nas dezenas de metros de lama abaixo do assoalho dos
oceanos; outros vão ainda mais para baixo, em rachaduras de rochas
sólidas, centenas de metros mais a fundo.
Os
cientistas estão apenas começando a investigar esse mundo subaquático.
No meio do Pacífico Sul, especialistas descobriram como bactérias
vivem em sedimentos pobres em nutrientes e sufocantes.
Outros
pesquisadores viram micróbios colonizarem um buraco a 280 metros do
fundo oceânico. E perto da montanha submersa que marca o meio do
oceânico Atlântico, cientistas encontraram organismos que não se parecem
com nenhum residente marinho conhecido.
Esses acontecimentos estão ajudando os biólogos a criar uma imagem do ecossistema do mundo do “fundo”.
Entender
como isso surgiu pode levar a uma melhor compreensão da origem da vida
na Terra. Um dia, os intraterrestres podem até ensinar mais sobre os
extraterrestres, já que são exemplos de vida em locais extremos.
Deserto oceânico
Considerando
que os oceanos cobrem a maior parte do planeta, é insano saber tudo o
que vive na lama e nas rochas deles. “É com certeza o habitat com o
maior potencial do planeta”, afirma o biólogo Beth Orcutt.
Alguns
estimam que pelo menos um terço da biomassa do planeta está enterrada
no chão oceânico. Muitas dessas bactérias e micróbios sobrevivem de
comida que vem de cima, como as sobras de plâncton.
Esses
micróbios conseguem existir onde não seria possível. No meio do
Pacífico Sul, por exemplo, está um vórtice onde a água circula em um
turbilhão gigante, do tamanho de duas Américas do Norte.
Como
esse fenômeno acontece muito longe de qualquer terra firme – onde
existem nutrientes para que os plânctons cresçam – o local é um
verdadeiro deserto oceânico.
Em
alguns locais desse ponto, o assoalho oceânico cresce oito centímetros
por milhão de anos. Isso significa que se você quiser plantar algo com
uma raiz de 16 centímetros, estará cavando em uma lama com dois milhões
de anos.
Essas zonas de baixa
produtividade, nos centros dos oceanos, são muito mais comuns do que as
ricas em nutrientes, nas costas, mas os cientistas não costumam
visitá-las por que são de difícil acesso.
Em
2010, D’Hondt liderou um grupo até o vórtice e coletou amostras do
fundo. “Nós queríamos ver como era a vida sedimentar da parte mais morta
do oceano”, afirma.
Entre outras
coisas, os cientistas descobriram como os micróbios da lama “se viram”.
Em outras áreas do oceano, onde mais nutrientes caem no assoalho, o
oxigênio está presente até um ou dois centímetros para dentro da lama.
Mas
no vórtice, a equipe de D’Hondt percebeu que o oxigênio penetrava até
80 metros nos sedimentos. Para os cientistas, isso sugere que os
micróbios respiram muito devagar, usando pouco oxigênio.
“Isso quebra algumas expectativas padrões, mas até estarmos lá e perfurarmos, ninguém sabia”, disse.
Outra
possibilidade é que os micróbios tenham outra fonte separada de
energia: radioatividade natural. Alguns elementos, presentes na lama e
em rochas, liberam radioatividade que quebra o H2O em hidrogênio e
oxigênio.
Os microrganismos podem
então consumir esses elementos, um fonte quase inesgotável. “Essa é a
interpretação mais exótica, que temos um ecossistema vivendo de
radioatividade natural que quebra as moléculas de água”, comenta.
Acesso fácil
A
milhares de quilômetros do vórtice, outros cientistas estão explorando
um local muito diferente, na cordilheira de Juan de Fuca – uma
montanha submersa que se encontra na convergência de muitas placas
tectônicas.
Juan de Fuca fica perto da costa do estado americano de Washington, recebendo muitos nutrientes e sendo de fácil acesso.
Como resultado, essa área é uma das mais analisadas. Uma rede de observatórios monitora quase todo o assoalho do oceano.
“Nós
podemos fazer experimentos ativos lá que não são possíveis em nenhum
outro local”, afirma Andrew Fisher, que ajudou a montar grande parte
dos instrumentos.
Muitas dessas
estações são observatórios conhecidos como CORKs, que são
essencialmente buracos bem fundos no chão oceânico fechados no topo.
Os pesquisadores colocam instrumentos de observação dentro dessas
crateras, e retornam alguns anos depois para retirá-los. Os dados
coletados podem revelar organismos, modos de vida e mudanças
populacionais.
Os CORKs são
tecnicamente complicados de serem instalados, mas as descobertas podem
ser fantásticas. Em um local de Juan de Fuca, em 2004, os pesquisadores
encontraram rochas com caules tortos que pareciam uma cobertura de
ferrugem.
Acontece que o CORK não havia sido fechado corretamente, e bactérias oxidantes entraram junto com a água.
Essas
bactérias inicialmente colonizaram o buraco e fizeram seus caules, se
alimentando das condições boas. Mas com o tempo, o buraco foi
esquentando devido ao calor vulcânico do fundo. O fluxo de água foi
revertido, jorrando para fora do buraco.
A
bactéria “do ferro” morreu, dando lugar a outros tipos de organismos:
bactérias conhecidas como fermicutes, encontrando em ambientes
similares, como o fundo do oceano Ártico.
As
pesquisas em Juan de Fuca também ajudam a entender como a água flui no
oceano, indicando os melhores lugares para encontrar micróbios.
As
pessoas costumam pensar que a água fica inerte no fundo do mar, mas na
verdade ela se move entre as rochas subaquáticas – circulando o
equivalente a todo o volume oceânico a cada 500 mil anos.
Em
Juan de Fuca, Fisher e seus colegas encontraram dois vulcões
subaquáticos, a uma distância de 50 quilômetros entre um e outro, o que
ajuda a explicar como esse grande movimento acontece.
“Esse é o primeiro lugar no assoalho oceânico onde os pesquisadores
conseguiram apontar o dedo no mapa e dizer ‘a água entra aqui e sai
aqui’”, comenta Fisher.
Os dois
vulcões estão arranjados em uma linha norte-sul que tende a controlar a
maior parte da atividade subaquática em Juan de Fuca.
Grande parte das rachaduras na crosta também vai do norte para o sul, fazendo dessa a direção provável dos micróbios.
Essas
falhas servem como uma espécie de estrada para os microrganismos,
carregados pela água. Cientistas que procuram por seres microscópicos
no fundo do oceano devem focar essas áreas.
Nadando em lagos
Muito
além de ser monolítico, o solo oceânico apresenta uma série de
ambientes diferentes. Um ponto novo, muito diferente de Juan de Fuca ou o
vórtice do Pacífico, fica no meio do Atlântico: o Lago Norte. Geólogos
vêm estudando esse local desde os anos 70, mas agora os microbiólogos
também estão lá.
O “lago” é uma
pilha de lama subaquática, isolada no meio de altas montanhas. Ele fica
a cerca de cinco quilômetros de onde a crosta oceânica está nascendo;
toda essa atividade geológica violenta força a água por entre a lama e
as rochas até o oceano superior.
Comparada
a de Juan de Fuca, a água no Lago Norte é muito mais fria – cerca de
10 graus Celsius, mas flui muito mais rápido. “A natureza encontra um
equilíbrio entre temperatura e movimento”, comenta Fisher.
Ele
e a equipe, liderados por Katrina Edwards, passaram 10 semanas no
lago. Eles instalaram dois novos CORKs, até 330 metros no fundo, e
conseguiram analisar possíveis micróbios.
Eles também colocaram pedaços de rocha dento dos buracos para analisá-los alguns anos depois.
Por
enquanto, o trabalho é dos microbiólogos de estudar o que já foi pego.
Eles estão apenas começando as análises, mas já suspeitam de muitas
surpresas.
No todo, estudos em
diferentes locais revelam que os micróbios do fundo do oceano são muito
mais diversos do que se pensava há uma década.
Muito
além de poucas espécies, os pesquisadores encontraram uma rica
diversidade de bactérias, fungos, vírus e outros. “Ficamos chocados de
serem tão complexos.
Pensávamos que iam ter umas 15 espécies, mas há uma diversidade enorme”, afirma a microbióloga Jennifer Biddle.
Ao
comparar os micróbios de diferentes locais suboceânicos, Biddle
encontrou quantidades maiores de arqueas – organismos unicelulares com
uma história evolutiva ainda mais antiga –, em alguns lugares, do que
bactérias. Ela pensa que os arqueas prosperam melhor na matéria orgânica
do solo oceânico.
Um novo projeto,
chamado de Censo da Vida do Fundo, vai ajudar Biddle e outros
cientistas a analisar e comparar os micróbios do oceano. O projeto pode
levar até uma década; o objetivo é encontrar regras gerais – se é que
elas existem – que expliquem onde e como os organismos se mantêm no
fundo dos oceanos.
“Por enquanto
você consegue ter uma ideia ao olhar para os pontos energéticos
presentes embaixo da superfície”, afirma o líder do projeto, Rick
Colwell. “Mas será que as rachaduras nos mais diversos ambientes
subaquáticos contêm certos tipos de microrganismos?”.
Muitos
dados ainda vão chegar. “Nós não estamos sofrendo de falta do que
fazer”, afirma Orcutt. Edwards e sua equipe planejam voltar ao Lago
Norte em abril, para recuperar os instrumentos.
Fisher
vai para Juan de Fuca novamente no próximo verão, e já conhece outro
ponto de estudo, na Costa Rica, onde a água flui milhares de vezes mais
rápido do que em Juan de Fuca.
Um
dia, as análises da biosfera do fundo talvez possam ajudar a NASA e
outras agências espaciais em suas caças por vida no sistema solar, e
então os intraterrestres vão ajudar os cientistas a encontrar os
extraterrestres.Fonte: Hypescience
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